RECOMENDAÇÃO: “Vinícius”, documentário sobre Vinícius de Moraes

"Eu diria, para terminar, que um poeta que é autor de poemas como a Balada do Mangue, por exemplo, só pode ser considerado um grande poeta".

“Muitos outros tiveram esse percurso, viraram ‘brasileiros’, mas não tanto [risos] ! Quer dizer, virar compositor popular e cair no esculacho completo, aí realmente é Vinícius, é mais que os outros nisso”. Essa fala é do poeta Ferreira Gullar, um dos entrevistados para o documentário “Vinícius”, dirigido por Miguel Faria Jr. e lançado em 2005.

Este documentário faz um retrato biográfico de Vinícius de Moraes (1913-1980), um dos poetas e compositores brasileiros mais célebres e queridos pelo público. Utilizando a realização de um pocket show em homenagem a Vinícius – apresentado pelos atores Ricardo Blat e Camila Morgado – como base para sua reconstituição da vida do artista, o diretor então aborda as diversas fases da vida do poeta: sua infância no Rio de Janeiro do início do século XX; seus anos escolares – desde o início, num colégio de padres jesuítas, até a bolsa de estudos que o levou à Universidade de Oxford, na Inglaterra; seus anos de diplomata, em que foi vice-cônsul em Los Angeles, nos EUA; além de toda a sua carreira artística, desde os primeiros poemas na infância até seu estabelecimento como um dos maiores poetas e compositores de música popular brasileira.

Como fonte para composição desse retrato do artista, o diretor convidou diversos entrevistados que poderiam descrever, com riqueza, Vinícius – como suas filhas, Suzana, Georgiana, Luciana e Maria. Além delas, foram convidadas também grandes figuras da cultura brasileira que tiveram contato com o poeta: os músicos Caetano Veloso, Edu Lobo, Maria Bethânia, Gilberto Gil, Carlos Lyra e Toquinho; o crítico literário Antônio Cândido; também o poeta Ferreira Gullar. E, para enriquecer ainda mais, o diretor utilizou registros em arquivo de artistas já falecidos, como dos músicos Baden Powell e Antônio Carlos Jobim, em que eles falam sobre sua relação com o “poetinha” – alcunha dada, aliás, por Tom Jobim.

O filme é rico em imagens. Registros do Rio de Janeiro do início do século XX, tanto das grandes avenidas, representativas da belle-époque, como também das favelas cariocas e seus habitantes, colorem a infância do artista. Fotografias dele em família, com amigos, na Inglaterra e nas praias do Rio também estão presentes.

E através de todo o filme haverá belo conteúdo visual: imagens de passeatas integralistas nos anos de 1930, registros dos históricos festivais de música popular nos anos 60, imagens de viagens de Vinícius com Toquinho, um de seus parceiros, por vários países da América Latina… Tudo isso para colorir a narração sendo feita pelos entrevistados.

A trilha sonora foi composta de maneira engenhosa. Como o diretor utilizou um pocket show como ponto de partida para a construção do filme, a trilha é composta por interpretações de artistas, nesse show, de composições assinadas por Vinícius de Moraes. Assim, temos o violonista Yamandú Costa interpretando a “Valsa de Eurídice”; Adriana Calcanhotto interpretando “Eu Sei Que Vou Te Amar”, grande sucesso do poeta; temos também “Insensatez”, na voz de Mônica Salmaso, e “Sei Lá (A Vida Tem Sempre Razão)” na voz de Mart’nália.

Complementando a trilha, há também interpretações dadas fora do pocket show, nas entrevistas individuais. Assim, ouvimos Caetano Veloso dando sua versão do “Poema dos Olhos da Amada”, versão musicada do poema homônimo, e Edu Lobo cantando sua versão de “Berimbau”.

O que mais dizer? Rico em seu conteúdo audiovisual, rico nas informações e na imagem que nos dá de Vinícius de Moraes, este documentário de Miguel Faria Jr. é indispensável para todos os que se interessam por poesia, por música, ou por uma boa história. Para finalizar, cito esta frase do crítico Antônio Cândido, dita no documentário:

“Ninguém chegou mais perto do [que] Vinícius da naturalidade, ninguém chegou mais perto da vida cotidiana, do prosaico – no entanto, dentro de uma poesia da continuidade e da perfeição formal. Eu diria, para terminar, que um poeta que é autor de poemas como a “Balada do Mangue”, por exemplo, só pode ser considerado um grande poeta”.

O documentário “Vinícius”, de Miguel Faria Jr., está disponível no catálogo da Netflix.

Odisseia
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