“Monte Castelo”, uma canção de Camões e São Paulo Apóstolo

"Sem amor, eu nada seria".

“Ainda que eu falasse a língua dos homens / e falasse a língua dos anjos / sem amor, eu nada seria”. Mas o que é o amor? “É o fogo que arde sem se ver / é ferida que dói e não se sente / é um contentamento descontente / é dor que desatina sem doer”…

Essas sequências de versos compõe a letra de “Monte Castelo”, canção da Legião Urbana (grupo de rock brasiliense, ativo de 1982 a 1996). Essa obra foi incluída no disco mais vendido da banda: o álbum “As Quatro Estações”, lançado em 1989.

A letra dessa canção é interessantíssima: não é apenas uma canção de amor, mas uma canção que é, na maior parte, uma colagem de dois grandes textos da literatura ocidental sobre o Amor: o 13º capítulo da Primeira Carta aos Coríntios, de São Paulo, e o soneto “O amor é fogo que arde sem se ver”, do poeta português Luís de Camões.

A canção é basicamente uma musicalização destes textos. Curiosamente, há dois versos em que não falam esses autores (Paulo e Camões), mas em que fala o autor da letra: “Estou acordado e todos dormem/ Todos dormem, todos dormem”. Estes versos dialogam com os que o seguem, extraídos da carta de Paulo: “Agora vejo em parte, mas então veremos face a face”. Ou seja, o autor se coloca na posição de alguém “desperto”, alguém que compreendeu o sentido das palavras que está cantando (ou seja, a suprema excelência do amor), enquanto todos os outros dormem – provocando, de certo modo, o ouvinte para que ele também “desperte” para a noção de “é só amor que conhece o que é verdade”.

É interessante levar em conta a mensagem da letra para tentar compreender seu título. “Monte Castello” é o nome de um monte italiano, localizado próximo a Pistoia. Durante três meses, entre novembro 1944 e fevereiro de 1945 (durante a Segunda Guerra Mundial), os soldados da Força Expedicionária Brasileira combateram o Exército Nazista na região desse monte, a fim de ampliar a presença das forças Aliadas no norte da Itália. Marcado por diversas baixas e lembrado pelo heroísmo dos “pracinhas”(soldados brasileiros), o embate se tornou um dos mais célebres sobre a contribuição brasileira ao combate contra os Nazistas, tornando-se conhecido como “Batalha de Monte Castelo”.

Portanto, comparando a mensagem da letra com seu título (que remete a um combate em uma guerra), podemos extrair dessa canção (dentre outras interpretações, é claro) uma mensagem antibelicista, uma espécie de lembrete de aonde está a verdade e o caminho nesse mundo: não em combates e mortes, mas no amor, na prática do amor. Ainda que se conseguisse comunicar com os homens, conseguindo entrar em acordo com eles e evitando combates, e ainda que se conseguisse falar a língua dos anjos, compreendo a realidade e talvez o sentido de nossa existência – mesmo assim: sem amor, eu nada seria.

Ouça a canção da Legião Urbana aqui. Leia aqui o trecho da Primeira Carta aos Coríntios e aqui o soneto de Camões. Além disso, leia um pouco sobre como foi a Batalha de Monte Castelo aqui.

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