Bom, estamos um pouco atrasados para o dia dos namorados, mas ainda podemos nos inspirar nesse mês de junho e falar sobre romance!
Nada é um consenso no mundo da literatura, mas, no geral, esse é um tema pelo qual os leitores têm muito apreço; afinal, quem nunca ficou envolvido com os sentimentos de algum casal ou torceu para que eles acabassem juntos?
Deve haver algum motivo para que Romeu e Julieta seja, até hoje, uma história tão famosa — essa peça, escrita por Shakespeare, já recebeu tantas adaptações que é impossível contar. Então, o que faz um bom romance?
Antes de mais nada, vamos esclarecer uma coisa:
Romance é um termo ambíguo na literatura; isto é, ele tem dois sentidos possíveis e que acabam sendo confundidos muitas vezes.
O primeiro sentido diz respeito ao formato do texto e pode apresentar qualquer tipo de conteúdo (suspense, aventura, etc.):
“Romance é uma obra literária que apresenta narrativa em prosa, normalmente longa, com fatos criados ou relacionados a personagens, que vivem diferentes conflitos ou situações dramáticas, numa sequência de tempo relativamente ampla.”
Disponível em: https://www.significados.com.br/romance/
O segundo sentido, o qual vamos usar aqui nesse texto, é o de histórias de amor. Ou seja, quando falamos de romance, nesse texto, estamos falando de histórias que têm como unidade de ação os sentimentos românticos de um ou mais personagens.
Certo, agora que esclarecemos isso, qual é a estrutura de uma história de amor? Afinal, elas fazem parte de um gênero e, portanto, são textos com características em comum relativamente estáveis.
Vamos pensar em Romeu e Julieta, mais uma vez: é a história de dois personagens que se conhecem e se apaixonam, mas não podem ficar juntos em razão de uma rixa familiar; eles desobedecem as regras e, então, chegamos no famigerado desfecho.
Para deixar mais claro, a estrutura base de uma história de amor é:
- Apresentação das personagens, que vão se apaixonar: geralmente são duas personagens em um sistema de 1/1 ou três personagens, formando aquilo que conhecemos por “triângulo amoroso”, com um sistema de 1/2.
- Despertar do interesse: às vezes elas já são amigas de longa data, outras vezes elas se conhecem durante o enredo, mas o fato é que em algum momento elas precisam começar a se sentir atraídas uma pela outra.
- Desenvolvimento da relação: intimidade não surge do nada, ela tem que ser construída aos pouquinhos. No fim das contas, interesse não é amor… o amor surge aos pouquinhos.
- Conflito: qual seria a graça se as duas pessoas se conhecessem, se apaixonassem instantaneamente e ficassem “felizes para sempre” sem maiores dramas? Mesmo na vida real temos que superar inseguranças e desentendimentos… e isso cria tensão na história.
- Desfecho: Como a história termina? Não precisa ser um final tipicamente feliz, (dois bons exemplos disso são o filme Call me by your name e a história chinesa Os amantes borboletas).
Vale ressaltar, isso não se aplica só para textos que tenham o romance como foco, mas também para arcos românticos dentro de um enredo que tenha outros conteúdos.
As ficções fantásticas tem muitos exemplos disso, como com o triângulo amoroso entre Will, Jem e Tessa, em As peças infernais, de Cassandra Clare. Nele, o romance é um dos elementos desenvolvidos, juntamente com os dramas pessoais de cada personagem e um certo suspense.
Outro exemplo é a saga de Sarah J. Maas, Trono de Vidro. Nela, a protagonista vive diversos arcos de romance, mas dificilmente poderíamos dizer que esse é o foco principal do enredo.
Por outro lado, temos livros como O amor nos tempos do cólera, de Gabriel García Márquez. Este realismo fantástico, por sua vez, tem sim o amor entre as personagens como elemento principal da narrativa: há outros elementos no texto, mas eles são arcos menores.
Ou seja, há tanto livros de romance, em que ele é a principal unidade de ação da narrativa, quanto arcos de romance, isto é, romances que acontecem dentro de outra história (onde há outros focos, mas isso também é desenvolvido).
Em todo caso, é importante que o romance seja bem desenvolvido para que a gente se envolva com o casal e torça por eles!
Tudo bem, nós sabemos quais são os elementos básicos desse gênero, mas escrever não é seguir receita de bolo.
Então… o que faz um romance ser bom, isto é, convincente e envolvente?
ABRACE A INTEGRIDADE DAS PERSONAGENS
Dentre tudo o que podemos listar aqui, o mais importante, sem dúvida, é o desenvolvimento individual das personagens. Você deve estar se perguntando, como assim? não estamos falando da trajetória de duas personagens? Sim, estamos.
Para elaborar o percurso entre os dois, antes precisamos construir muito bem as suas individualidades. Assim, com dois seres tridimensionais, com qualidades e falhas, e com uma identidade definida, a interação entre eles será mais verossímil.
Além disso, é muito importante manter a integridade dos personagens, custe o que custar. Não jogue no lixo o desenvolvimento das personagens por conta do romance; eles são indivíduos em um mundo e por isso devem ser fiéis à suas próprias características.
Se sua protagonista tem, por exemplo, dificuldade em assumir compromissos, não faça com que ela comece a namorar sério seu interesse romântico tão cedo. Para isso, ela terá que superar alguns obstáculos, amadurecer e passar a valorizar a outra personagem o suficiente para confrontar suas questões psicológicas.
Nada disso acontece de uma hora para a outra.
Se a personalidade da sua personagem não pode existir no relacionamento em que você a está colocando, tome cuidado. A não ser que você esteja tratando de um relacionamento tóxico e que isso tenha repercussões negativas para o protagonista, não anule os personagens pelo romance.
Uma ótima obra para ilustrar essa ideia é o famoso e adorado Orgulho e Preconceito. No livro, Elisabeth e Darcy são personagens com uma individualidade marcante e que, mesmo assim, acabam por encontrar um terreno comum e se aceitam da forma que são.
ESPERE O MOMENTO CERTO
Outro aspecto que devemos levar em consideração — e que, na verdade, se relaciona muito com o anterior — é o “timing”.
Como já discutimos antes, as coisas não são instantâneas: ninguém se vê pela primeira vez, se apaixona e se torna a prioridade da vida do outro de uma vez. Intimidade, amor, carinho e confiança levam tempo para serem construídos.
Por isso, respeite o tempo dos personagens, não apresse as coisas. Caso você faça isso, provavelmente o leitor vai ter aquela horrível sensação de que o texto foi “forçado”.
Então não pode beijar logo no começo da história?
Não, não é isso. Mas entenda que esse beijo logo no início está em um contexto diferente daquele que acontece depois de todos os conflitos e acontecimentos que fizeram com que as personagens se envolvessem com maior intimidade.
O que dá valor emocional para o beijo são os próprios sentimentos que surgiram e, aos pouquinhos, se acumularam entre os dois. Um beijo “precoce” tem que ser tratado como tal, como algo que pode ser fruto de uma paixonite ou atração, mas que não significa muito sentimentalmente.
CRIE EMPECILHOS
A complexidade é a maior diferença entre realidade e um sonho, onde tudo pode acontecer de forma simples e ingênua e onde quem ama é sempre correspondido. A vida não é assim, há riscos e consequências.
É claro, a ficção não precisa ter compromisso com a realidade, mas buscar profundidade psicológica no seu enredo torna a sua trama muito mais envolvente. O leitor precisa conseguir se identificar com as emoções do texto.
Ao estruturar uma trama, não ignore o mundo real, com sua complexidade, seus contratempos, dificuldades. Se você sentir que sua história está “perfeita demais para ser verdade” e se pergunte: meu texto está vivendo um sonho?
Então, crie algum tipo de conflito! Nem tudo na vida são rosas e, convenhamos, nós adoramos um bom drama.
Isso não significa que você deva criar vilões mirabolantes ou situações apocalípticas, isso vai depender da sua proposta sobre o enredo. Às vezes o interesse romântico vai ser unilateral e isso é uma espécie de conflito; outras, as questões pessoais das personagens podem ser um empecilho.
Vamos olhar para alguns exemplos:
A culpa é das estrelas é um romance escrito por John Green, nele Hazel e Gus, dois adolescentes, se envolvem amorosamente. Apesar desse cenário aparentemente ideal, as circunstâncias geram um obstáculo à sua paixão: ambos têm câncer, e Hazel sempre descartou a ideia de um relacionamento por conta da doença.
As vantagens de ser invisível: o livro de Stephen Chbosky não tem como foco o romance, focando na vida de Charlie; ele trata de temas como doenças psicológicas, sexualidade e amizade. Os próprios dramas da vida adolescente dão complexidade ao romance entre Charlie e Sam.
Como pudemos observar, não existe só uma única maneira de desenvolver um conflito; ele pode surgir por fatores externos e internos aos personagens — filmes de super-heróis são um ótimo exemplo de conflitos externos, com vilões e situações desafiadoras.
Por fim, para resumir esses três pontos, vamos agora analisar um filme que já mencionamos mais cedo: Call me by your name (SPOILERS A SEGUIR).
A narrativa acontece através da visão de Elio, um jovem que está vivendo um típico verão preguiçoso na casa de seus pais na Itália dos anos 80. Seu pai, professor acadêmico, costuma receber alguns alunos que estejam trabalhando em suas pesquisas e, nesse verão, tem como visitante Oliver.
Nenhum dos dois demonstra interesse (apesar de se sentirem atraídos), na verdade, Elio inclusive expressa várias críticas à Oliver, dizendo que acha alguns de seus hábitos irritantes, como a forma que diz “later” (até mais). Ambos têm que vencer a barreira inicial da época em que vivem.
O romance entre os dois, como homens, não seria algo comum ou bem visto na época e, apesar da abertura que os pais de Elio têm para o tema, isso ainda é uma forma de impedimento.
Assim, durante boa parte do filme, vivemos a expectativa do romance. Antes que qualquer coisa aconteça, vemos um carinho crescer entre Elio e Oliver e isso faz com que valorizemos suas emoções (FIM DO SPOILER).
Não vamos contar aqui o fim do filme, mas podemos dizer que ele é um ótimo exemplo de como ambos os personagens e, posteriormente, sua relação são desenvolvidos. Nós nos envolvemos profundamente com seu romance porque ele parece autêntico.
CONCLUSÃO
Por fim, podemos concluir que uma boa história de amor precisa ter um compromisso com a forma como amamos na vida real. Amar é algo que acontece aos poucos, confiança é algo que é construído com o tempo e intimidade não vem de uma hora para a outra.
Além disso, apesar de estarmos em um relacionamento, continuamos sendo indivíduos únicos e independentes, não fundimos com a outra pessoa em uma mesma personalidade.
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